Crato. Um grupo de cangaceiros foi assassinado e os corpos foram arrastados por policiais. Esta é uma das cenas dramatizadas pelo grupo "Quadrilha do Beato José Lourenço", do bairro do Seminário, que destacam a história de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, na programação artística do Seminário "Cariri Cangaço". Durante quatro dias, o evento discute assuntos sobre este fenômeno que marcou parte da História do Brasil. "Grupos de homens armados vagueavam pelos sertões, principalmente do Nordeste, buscando meios de sobrevivência, e o enfrentamento dos poderosos com o uso de suas armas e de sua coragem", disse o curador e coordenador do encontro, Manoel Severo. A afirmativa foi confirmada pelo presidente da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço, Ângelo Osmiro.
A solenidade de abertura, realizada no Teatro Salviano Arraes, contou com a presença de 77 historiadores, pesquisadores, escritores, estudantes, artistas, cineastas, atores e ensaístas do Nordeste, entre os quais Antônio Amaury Correia, apontado como o maior escritor sobre o cangaço no Brasil. "É o maior evento sobre a temática do Cangaço já realizado no Brasil. A primeira conferência foi pronunciada pelo professor de História, Lemuel Rodrigues da Silva, que abordou o tema "Cangaço e Religiosidade", disse.
Personalidade
Um dos aspectos marcantes da personalidade contraditória de Lampião, segundo Lemuel, era a sua religiosidade. Apesar de sua vida de cangaceiro e das influências brutalizantes do cangaço, Lampião nunca abandonou a sua fé. Quando ele foi assassinado, em 1938, na Grota de Angicos, tinha acabado de rezar o ofício de Nossa Senhora. O cangaceiro cruel era o mesmo que se ajoelhava, com o rosário na mão, diante de Deus, dos santos da Igreja Católica, e também no Padre Cícero Romão do Juazeiro do Norte que, para ele, era um homem santo.
O Nordeste dos cangaceiros viveu esta dicotomia. Cangaceiros e beatos, ambos são frutos da mesma cultura sertaneja. A diferença é que um escolheu o rosário, a pregação como instrumentos de salvação. O outro preferiu o fuzil e o punhal. Lampião, segundo o historiador, era um cangaceiro místico.
O Cariri, em razão do prestígio do Padre Cícero, exerceu uma forte participação no cangaço. "No entanto, não podemos vincular a figura do sacerdote ao cangaço", esclarece o historiador, acrescentando que qualquer outro padre da época poderia ter exercido influência sobre o comportamento de Lampião que, de certo modo, tinha o maior respeito por Padre Cícero. Lemuel cita os escritores Nertan Macedo e Abelardo Montenegro como defensores da tese de que beatos e cangaceiros caminharam juntos.
Beatos e cangaceiros, na interpretação do escritor cratense Nertan Macedo, são duas faces da mesma moeda. Cangaço e misticismo são temas que dominaram a cultura regional. O homem sertanejo que viveu no final do século XIX e início do século XX conviveu com místicos e cangaceiros. Produtos da mesma cultura, vítimas de igual opressão. Em sua vida nômade de cangaceiro, o medo da traição ou de uma emboscada pelos caminhos, faziam parte do seu cotidiano, por isso Lampião possuía devoção e buscava a proteção dos santos.
O ciclo de palestras foi transferido ontem para Juazeiro do Norte com o tema "Lampião, nem bandido, nem herói", abordado pelo presidente da Fundação Cabras de Lampião, Anildomá Wilians. Hoje, os participantes visitarão os pontos turísticos e os locais por onde os cangaceiros passaram. A programação termina no dia 27, em Missão Velha. No rastro de Lampião, surgiram no Cariri grupos de malfeitores que deixaram marcas de sangue na região, formados pelos irmãos "Bomdeveras e Lua Branca".
Polêmica
Uma das maiores polêmicas envolvendo Padre Cícero se deu no ano de 1926, quando Lampião recebeu a patente de "Capitão". O assunto será levantado pelo médico e escritor Napoleão Tavares Neves. Os historiadores contam que, em maio de 1926, Lampião e seu bando chegaram a Juazeiro, a convite de Floro Bartolomeu da Costa, médico baiano radicado em Juazeiro e uma espécie de braço político do Padre Cícero.
O motivo seria que Lampião e seu grupo dessem combate à Coluna Prestes. Para tal, Lampião receberia uma patente de Capitão do Batalhão Patriótico. A concessão destas patentes, não reconhecidas pelas forças policiais, gerou uma polêmica que ainda perdura. O Padre Cícero pagou caro. Foi acusado de "coiteiro" de bandidos.
PÚBLICO
77 pesquisadores participam do encontro sobre a importância do cangaço para a cultura do Nordeste e a História do Brasil
ANTÔNIO VICELMO
REPÓRTER
Fonte: Diário do Nordeste
A solenidade de abertura, realizada no Teatro Salviano Arraes, contou com a presença de 77 historiadores, pesquisadores, escritores, estudantes, artistas, cineastas, atores e ensaístas do Nordeste, entre os quais Antônio Amaury Correia, apontado como o maior escritor sobre o cangaço no Brasil. "É o maior evento sobre a temática do Cangaço já realizado no Brasil. A primeira conferência foi pronunciada pelo professor de História, Lemuel Rodrigues da Silva, que abordou o tema "Cangaço e Religiosidade", disse.
Personalidade
Um dos aspectos marcantes da personalidade contraditória de Lampião, segundo Lemuel, era a sua religiosidade. Apesar de sua vida de cangaceiro e das influências brutalizantes do cangaço, Lampião nunca abandonou a sua fé. Quando ele foi assassinado, em 1938, na Grota de Angicos, tinha acabado de rezar o ofício de Nossa Senhora. O cangaceiro cruel era o mesmo que se ajoelhava, com o rosário na mão, diante de Deus, dos santos da Igreja Católica, e também no Padre Cícero Romão do Juazeiro do Norte que, para ele, era um homem santo.
O Nordeste dos cangaceiros viveu esta dicotomia. Cangaceiros e beatos, ambos são frutos da mesma cultura sertaneja. A diferença é que um escolheu o rosário, a pregação como instrumentos de salvação. O outro preferiu o fuzil e o punhal. Lampião, segundo o historiador, era um cangaceiro místico.
O Cariri, em razão do prestígio do Padre Cícero, exerceu uma forte participação no cangaço. "No entanto, não podemos vincular a figura do sacerdote ao cangaço", esclarece o historiador, acrescentando que qualquer outro padre da época poderia ter exercido influência sobre o comportamento de Lampião que, de certo modo, tinha o maior respeito por Padre Cícero. Lemuel cita os escritores Nertan Macedo e Abelardo Montenegro como defensores da tese de que beatos e cangaceiros caminharam juntos.
Beatos e cangaceiros, na interpretação do escritor cratense Nertan Macedo, são duas faces da mesma moeda. Cangaço e misticismo são temas que dominaram a cultura regional. O homem sertanejo que viveu no final do século XIX e início do século XX conviveu com místicos e cangaceiros. Produtos da mesma cultura, vítimas de igual opressão. Em sua vida nômade de cangaceiro, o medo da traição ou de uma emboscada pelos caminhos, faziam parte do seu cotidiano, por isso Lampião possuía devoção e buscava a proteção dos santos.
O ciclo de palestras foi transferido ontem para Juazeiro do Norte com o tema "Lampião, nem bandido, nem herói", abordado pelo presidente da Fundação Cabras de Lampião, Anildomá Wilians. Hoje, os participantes visitarão os pontos turísticos e os locais por onde os cangaceiros passaram. A programação termina no dia 27, em Missão Velha. No rastro de Lampião, surgiram no Cariri grupos de malfeitores que deixaram marcas de sangue na região, formados pelos irmãos "Bomdeveras e Lua Branca".
Polêmica
Uma das maiores polêmicas envolvendo Padre Cícero se deu no ano de 1926, quando Lampião recebeu a patente de "Capitão". O assunto será levantado pelo médico e escritor Napoleão Tavares Neves. Os historiadores contam que, em maio de 1926, Lampião e seu bando chegaram a Juazeiro, a convite de Floro Bartolomeu da Costa, médico baiano radicado em Juazeiro e uma espécie de braço político do Padre Cícero.
O motivo seria que Lampião e seu grupo dessem combate à Coluna Prestes. Para tal, Lampião receberia uma patente de Capitão do Batalhão Patriótico. A concessão destas patentes, não reconhecidas pelas forças policiais, gerou uma polêmica que ainda perdura. O Padre Cícero pagou caro. Foi acusado de "coiteiro" de bandidos.
PÚBLICO
77 pesquisadores participam do encontro sobre a importância do cangaço para a cultura do Nordeste e a História do Brasil
ANTÔNIO VICELMO
REPÓRTER
Fonte: Diário do Nordeste
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