A burocracia da indústria da seca

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Famílias atingidas pela seca no interior do Estado, em 60 Municípios cearenses, estão conseguindo receber água pelos carros-pipas. Mas a falta de contingente militar agrava a distribuição
FOTO: CID BARBOSA
15/10/2010
Inconstância no fornecimento de água para consumo através de caminhões tanque irrita e preocupa população rural
Quixadá.
A falta de efetivo não é privilegio das polícias Civil e Militar. O Exército também enfrenta problemas com o número reduzido de profissionais em seus quadros. Como na segurança pública, a insuficiência está prejudicando a população sertaneja. Milhares de famílias estão deixando de receber água considerada adequada ao consumo humano. A distribuição é feita através da Operação Pipa, um programa emergencial do Governo Federal, coordenado no Ceará pela 10ª Região Militar. O diagnóstico é apresentado pela Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Estado do Ceará (Fetraece). De acordo com o secretário de Política Agrícola da Fetraece, Luiz Carlos Ribeiro, a falta de militares está impossibilitando a distribuição de senhas para os pipeiros e levantamentos técnicos nos Municípios que aguardam implantação no programa. O problema foi levado à Secretaria Nacional de Defesa Civil (Sedec). A reunião com a secretária Ivone Valente ocorreu na semana passada, em Brasília.

A Assessoria de Polícia Agrícola da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) representou a Fetraece no encontro. O secretário da Fetraece também destacou a proposta da Coordenadoria da Defesa Civil do Ceará em atuar juntamente com o Exército para agilizar a contratação de carros-pipa para os Municípios onde há prioridade no atendimento.

Ele se refere aos cinco implantados recentemente, outros 16 suspensos temporariamente e 34 em processo administrativo para implantação. Atualmente no Estado, apenas 60 municípios são atendidos pela Operação Pipa. Os levantamentos foram feitos pela Sedec e pelo Exército. Os números poderão ser ainda maiores se as Prefeituras de outros municípios em situação de emergência publicarem os decretos.

Racionamento
Pipeiros - como são conhecidos os proprietários de caminhões tanque engajados na distribuição de água - da região Centro do Estado confirmam o abastecimento irregular. Em algumas localidades houve até racionamento. O número de tíquetes não era suficiente para encher as cisternas. Algumas deles receberam 40% a menos. Os moradores ficaram revoltados. "O pior é que acabou sobrando para a gente. Alguns queriam até quebrar o meu caminhão. Isso não é justo. Além das estradas ruins ainda apanhar e ter prejuízo por causa dos outros", desabafou um caminhoneiro, pedindo para não ter seu nome revelado com receio de ser excluído.

Segundo lideranças sindicais e comunitárias do Sertão Central, nenhuma cisterna de placa possui mais água acumulada pelas chuvas. Os açudes mais próximos aos povoados estão secando, dificultando inclusive o banho e o uso para as atividades domésticas. "Por esse motivo não há quem não se irrite com o fornecimento inconstante de água", acrescenta o presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Quixadá, Eronilton Buriti.

Prestação de contas
No mês de março passado o abastecimento foi suspenso em todo o Estado. A assessoria do Ministério da Integração alegou mudanças na estrutura funcional do órgão federal. O técnico da Sedec, responsável pela coordenação do programa, Júnior Amorim, assegurou que a operação não foi desativada, houve apenas uma paralisação temporária. Na época, ele justificou a necessidade de prestação de contas da Operação Pipa de 2009. Nos anos anteriores a média de municípios do Nordeste atendidos era de 350 a 380. No ano passado, o número dobrou.

Desde então, ocorreram três paralisações. A última foi em agosto passado, em decorrência do atraso do pagamento dos carros-pipa, pelo Ministério da Integração Nacional para o Exército. Quase 500 caminhões contratados pelo Exército estavam circulando pelas rotas do interior. São mais de 7.500 pontos de entrega de água. Mesmo temporárias, as suspensões sempre causam preocupação para as coordenadorias municipais de Defesa Civil e Prefeituras.

Enquanto o Exército e a Defesa Civil enfrentam dificuldades para atender a população, os recursos hídricos do Ceará são suficientes até o término da estiagem. Segundo o assessor da presidência da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh), Yuri Castro de Oliveira, atualmente o nível acumulado de armazenamento de água no Ceará nos reservatórios monitorados pelo órgão é de 62,6%. A simulação prevista no início de agosto passado prevalece, com um pequeno decréscimo. Até o fim dezembro, os 130 reservatórios das 11 bacias hidrográficas espalhadas pelo Estado terão 55,5% de água. São 11,16 bilhões de metros cúbicos. O suficiente para abastecer um milhão de cisternas.

A reportagem manteve contato telefônico com os escritórios da 10ª Região Militar e da Defesa Civil do Ceará. O coronel Felipe Ribeiro, da 10ª RM, justifica a participação de 30% do efetivo no programa emergencial. "Os militares trabalham 24 horas por dia, inclusive nos fins de semana". Ele salienta haver outras atribuições constitucionais para a corporação. Quanto aos demais problemas, ele os atribui à necessidade de reajustes administrativos para se adaptarem a um novo modelo de distribuição de senhas estabelecido pelo Comando de Operações Terrestres, responsável pelos recursos financeiros disponibilizados pelo Governo Federal.

O coronel Vasconcelos, da Defesa Civil do Estado, estava em compromisso. Um assessor orientou a manter contato telefônico com outro oficial, coronel William Lopes. Até o encerramento desta edição as ligações não foram atendidas.

A Operação Pipa é um programa de distribuição de água para comunidades rurais do semiárido nordestino afetadas pelo desabastecimento de água na seca. Essa água deve ser usada apenas para consumo humano. A distribuição é feita por caminhões-pipa contratados pelo Exército Brasileiro.

Redução
40% a menos de tíquetes para distribuição de água por pipeiros no Sertão Central foi o problema constatado na região e confirmado pelos motoristas dos caminhões que transportam a água

MAIS INFORMAÇÕES
Fetraece, (85) 3231.5887
10ª Região Militar
(85) 3255.1702
Defesa Civil, (85) 3101.4571

ALEX PIMENTELCOLABORADOR

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