Angolana vencedora Miss Universo 2011, sofre racismo em site nazista

G1
Foto: Divulgação
Instantes após vencer o Miss Universo na noite desta segunda-feira (12), em São Paulo, a angolana Leila Lopes, de 25 anos, passou a receber ofensas racistas na internet pelo fato de ser negra. Mensagens em português e em inglês postadas num site internacional que se define nacionalista branco e possui adeptos do ditador nazista Adolf Hitler compararam a ganhadora do título de mais bela do mundo a uma ´macaca´. A brasileira Priscila Machado, 25 anos, que ficou em terceiro lugar, também sofreu insultos, sendo chamada de ´crocodilo´.

A miss Ucrânia Olesia Stefa, 23, segunda colocada no concurso, foi ´garfada´ na opinião de alguns dos participantes dos fóruns de discussão ´Miss Universo 2011´ e ´Angolan negress crowned Miss Universe´ (Angolana negra coroada Miss Universo, numa tradução livre do inglês para o português) do Stormfront (frente de tempestade).

´Angolana? Depois falam que não é resultado arranjado, é pura cota, podia por uma macaca para competir que ganharia também, foi totalmente aleatório mas tinha que ser uma das pretinhas, pela mor... Alguém assistiu essa porcaria? Serio?´, escreve um integrante da comunidade brasileira do site a respeito de Leila receber a coroa e a faixa. O autor do texto acima utiliza o símbolo da suástica nazista abaixo de um pseudônimo.

Outro membro escreveu em inglês ´monkey in a dress? absolutely revolting´ (macaco em um vestido? absolutamente revoltante) abaixo da foto de Leila.

O Stormfront já é investigado pela Polícia Civil de São Paulo por suspeita de ligações com grupos neonazistas que promovem ataques a negros, judeus, nordestinos e imigrantes no estado. De acordo com investigadores, os responsáveis pelas mensagens usam apelidos por medo. Caso sejam identificados, podem responder por crime de injúria racial. Mas para isso, é necessário que as vítimas prestem queixa numa delegacia.

Caso sejam considerados culpados, os donos dos comentários podem ser condenados a penas de reclusão de 1 a 3 anos. Como a punição é de menor potencial ofensivo, ela pode ser convertida em pagamentos de cestas básicas ou prestações de serviços comunitários

´filha do King Kong´
´Confesso que nem assisti, pois já imaginava o que viria a acontecer. Agora só falta Hollywood chamar a vencedora para fazer o papel da filha do King Kong´, afirma outro integrante na página do Stormfront sobre a nova miss universo. Este diz morar em Santa Catarina.

Outro membro se mostra revoltado ao afirmar que a escolha de uma negra, na opinião dele, é uma ofensa às europeias. ´Sabia que ia dar preta... como um Miss Universo no Brasil não escolheria uma preta? E olha que cara horrível, cabelo repulsivo, como conseguem escolher uma coisa dessas? Eu me indigno, não com os jurados, que são comprados para promover tais afrontas a cultura europeia, mas sim com as ovelhas que assistem isso e acham normal´, diz um participante que afirma morar no Rio Grande do Sul.




Sobre a brasileira Priscila Machado, um membro diz que ele se parece com um réptil. ´Vou secar a brasileira e angolana. Mulambenta dos infernos. A brasileira parece um crocodilo sorrindo, e a angolana um poste de luz. HORRENDAS´

Outro stormfronter, como os membros do site se referem um a outro, alega que as mensagens postadas no site não são ofensivas e não incitam o preconceito. ´Até porque não estamos pregando a intolerância/ódio, apenas nos divertindo com a situação. Sabíamos que ia acabar em várzea...´, diz um participante.

Reincidente
Alguns membros demonstrando que não sofrerão punição alguma fazem piada a respeito dos posts racistas e como eles seriam abordados pela imprensa. Essa não é a primeira vez que o Stormfront causa polêmica.

Na semana passada, o site, que usa a web para reunir grupos de intolerância, xingou as candidatas negras ao Miss Universo com palavras racistas. Oitenta e nove representantes de diferentes nacionalidades, ascendências e misturas raciais disputaram o título.

Também houve insultos às europeias, colocando em xeque o ´grau de pureza´ racial das garotas, levando-se em conta a opção religiosa delas. Havia outros questionamentos se elas são realmente brancas pelo fato de algumas não terem olhos azuis e cabelos loiros. Procurada, a assessoria de imprensa da organização do concurso não quis comentar o assunto na semana passada.
O G1 não conseguiu localizar a miss universo Leila Lopes nem as misses do Brasil e da Ucrânia para comentarem o assunto.

Em entrevista coletiva à imprensa, realizada na madrugada desta terça-feira (13), Leila chegou a ser questionada sobre o preconceito racial. Em sua resposta, a miss universo, que não foi indagada a respeito das mensagens ofensivas que sofreu no site Stormfront, afirmou: ´acho que pessoas preconceituosas é que precisam procurar ajuda, porque não é normal, em pleno século 21, alguém ainda pensar dessa forma´.

Procurados pela equipe de reportagem, os organizadores do Miss Universo afirmaram que não iriam falar sobre os novos ataques racistas, dessa vez, contra Leila.

Em julho, a brasileira Silvia Novais, de 24 anos, eleita Miss Itália no Mundo 2011, já tinha sido vítima de racismo dos mesmos ´nacionalistas´ do site contrários à escolha dela pelo fato de a modelo ser negra. O G1 publicou reportagens sobre o caso. Ela havia vencido o concurso na Europa como a mais bela descendente de italianos. Seu bisavô materno nasceu em Florença. Num dos insultos, ela foi xingada em inglês de ´negra nojenta´. Procurada, a miss lamentou as ofensas, mas não registrou queixa na polícia.


Investigação
O Stormfront e seus membros são investigados há alguns anos pela Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), do Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), por suspeita de ser uma comunidade neonazista que recruta brasileiros. O grupo foi criado na internet nos Estados Unidos no início dos anos 1990 e arregimentou muitos paulistas. Segundo a polícia, para difundir a manutenção e expansão da raça branca, seus integrantes combinam ataques a negros, judeus, homossexuais, nordestinos e imigrantes ilegais.

Apesar de informar na sua página que a comunidade não é neonazista, racista, homofóbica e intolerante, há citações e fotos de oficiais de Hitler, suásticas e símbolos nazistas.

Stormfront
O G1 não conseguiu localizar os responsáveis pelo Stormfront para comentar o assunto. Eles não usam seus nomes verdadeiros e se escondem por trás de pseudônimos para não serem identificados, segundo a polícia. Também há um recado em inglês que informa os visitantes sobre o conteúdo que vão encontrar:

´Somos uma comunidade de nacionalistas brancos. Há milhares de organizações que promovem os interesses, valores e patrimônio de não brancos. Promovemos o nosso. Você está convidado a navegar nos nossos 7 milhões de postos, mas você deve se registrar antes de postar em qualquer fórum, exceto aqueles designados como aberta a convidados´.


O Stormfront informa ainda que sua ´missão é fornecer informações não disponíveis nos meios de comunicação controlados e construir uma comunidade de activistas Brancos, trabalhando para a sobrevivência de nosso povo´.

Dentre as regras de postagem dos comentários no site estão: ´Não use linguagem abusiva, vulgar ou desrespeitosa. Evite epítetos raciais. Não faça críticas pessoais a outros usuários que são cruéis, duras ou agressivas´.

Apesar disso, as mensagens postadas no site não seguem as regras do Stormfront. Tanto que num dos tópicos do Miss Universo um outro participante chama a atenção dos usuários que fazem uso de palavras e frases racistas para tomarem cuidado com eventuais processos.

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