De 2009 para 2010, o número de denúncias contra profissionais de enfermagem praticamente dobrou.
Em uma situação alarmante, pacientes recebem medicações
trocadas, crianças sofrem lesões graves, e mortes causadas por erros
banais estão cada vez mais comuns.
No Rio de Janeiro, fiscais do Conselho Regional de Enfermagem (Coren) entram no Hospital Geral de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. A superlotação é evidente. Regras básicas da enfermagem são quebradas a todo instante. Uma profissional faz um procedimento em uma paciente sem usar luvas. “Eu não lembrei, na verdade. Mas não é sempre”, defende-se ela. Perguntada sobre a existência de material suficiente para trabalhar, a funcionária garante que tem.
No pronto-socorro, a fiscal se espanta com as condições do braço de um paciente, onde um acesso para medicação foi implantado seis dias antes.
“Você via ali um tecido roxo, que é sinal de infecção. Aquele procedimento, ao menor sinal de vermelhidão local, tem que ser trocado”, explica Ana Teresa Ferreira de Souza, chefe da fiscalização do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro (Coren-RJ).
Momentos depois, a auxiliar continua sem luvas. Ela garante que é só para botar o soro. “Observamos que ela não fez a higienização das mãos e atendeu vários pacientes ao mesmo tempo. Ela pode estar transmitindo bactérias de um paciente para o outro”, alerta a fiscal do Coren-RJ Wendy Koehler. E o pior de tudo: “Nada tem rótulo, eu não sei o que está sendo infundido”, acrescenta ela.
“A grande maioria dos pacientes estava com soro sem rótulo, sem identificação de nome e medicação”, denuncia Ana Teresa. É uma prática extremamente arriscada. “Você não tem identificação do nome do paciente, do horário daquele medicamento nem do próprio medicamento e dosagem. Com isso, você pode ter a troca”, diz a chefe da fiscalização do Coren-RJ.
As fiscais cobram explicações da enfermeira responsável pelo pronto-socorro. “Você pode fazer uma identificação menor, mas essa identificação tem que ter”, afirma a chefe de enfermagem. “Tenho que ver com a equipe por que isso não está sendo feito”, acrescenta ela.
Ana Teresa Ferreira de Souza especula sobre o motivo de alguns profissionais de enfermagem não seguirem os procedimentos corretos: “O hábito de estar fazendo aquilo, achar que o erro nunca vai acontecer com ele, que a fatalidade nunca vai chegar àquele profissional”. Só no Estado do Rio, o número de denúncias contra profissionais de enfermagem praticamente dobrou de 2009 para 2010.
Se dependesse apenas dos números, o brasileiro tinha tudo para estar em ótimas mãos. Existem hoje no país 1,5 milhão de enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem. A cada ano, surgem pelo menos cem mil novos profissionais. Felizmente, a maioria cuida bem dos pacientes. Mas nunca houve tantos erros cometidos pela categoria.
“Nós temos observado, principalmente nos últimos cinco anos, um aumento muito grande das denúncias, um incremento da ordem de 20% a 25% ao ano. Erros simples que poderiam ser perfeitamente evitados se esse atendimento tivesse sido realizado com maior atenção”, aponta Manoel Carlos Neri, presidente do Conselho Federal de Enfermagem.
A equipe do Fantástico foi até o interior do Ceará, na zona rural do município de Missão Velha, que fica a 600 quilômetros de Fortaleza, para conversar com a família de dona Maria Laurentino. Ela tinha 78 anos e passou mal em julho de 2011. Estava com cansaço e dificuldade para respirar. Foi levada para o hospital da cidade e acabou sendo vítima de um erro de uma auxiliar de enfermagem.
“Entrei com ela no hospital, vi a enfermeira aplicando soro no braço dela”, conta José de Souza, filho de dona Maria.
“Começou a aparecer umas espumas na lateral da boca”, continua Rosa Laurentino, nora de dona Maria.
De madrugada, dona Maria foi transferida às pressas para outro hospital, no município vizinho de Barbalha. “O médico que atendeu ela foi quem falou que ela tinha vindo de lá com uma medicação imprópria”, acrescenta Silvana de Souza, neta de dona Maria.
Às 7h, dona Maria Laurentino morreu. “Ela cansava de ir na roça, colher feijão. Catava feijão. Minha mãe morreu”, lamenta, emocionado, o filho.
No laudo do IML, a causa da morte: embolia pulmonar por infusão de glicerina. No lugar do soro, a auxiliar de enfermagem do hospital de Missão Velha injetou em dona Maria uma substância oleosa usada para lavagem intestinal. No sangue, a glicerina causa um entupimento de vasos e artérias e rapidamente atinge o pulmão e o coração. O caso foi parar na polícia.
O frasco de soro é bem diferente do frasco de glicerina. Ela pegou o liquido e reparou que não havia o gancho para pendurar no suporte. Ela estranhou isso. Então pegou o frasco e fez um suporte com esparadrapo. “Em nenhum momento ela leu a etiqueta que estava posta no frasco. Tinha lá: glicerina a 12%”, diz o delegado Marcos Antônio dos Santos.
A auxiliar de enfermagem foi afastada do hospital e indiciada por homicídio culposo. Ela não quis conversar com a reportagem. Procuramos o médico que prescreveu o soro para dona Maria. Ele é o diretor clínico do hospital de Missão Velha, um lugar onde medicamentos controlados dividem espaço com grilos.
Fantástico: Por que deram a medicação errada para ela?
Luciano Santana, diretor clínico do hospital de Missão Velha: Essa pergunta eu não posso responder porque não fiz a medicação. Aliás, eu não administro medicação.
Fantástico: O senhor não viu o frasco que ela pegou?
Luciano Santana: Não vi. Ela foi pegar lá dentro. O médico prescreve e entrega para o auxiliar e o enfermeiro que esteja por lá para ver.
De acordo com a lei, auxiliares e técnicos só podem trabalhar com a supervisão de um enfermeiro. Mas não foi isso que aconteceu naquela madrugada.
Fantástico: Por que não tinha uma enfermeira?
Luciano Santana: Não sei te dizer.
Fantástico: O senhor é diretor clinico do hospital.
Luciano Santana: Bem, mas o que aconteceu foi o seguinte: até 22h, tinha um enfermeiro.
Fantástico: De 22h às 5h não tinha.
Luciano Santana: Aí eu não sei. Eu não sei lhe falar onde estava no momento.
Histórias como essa não acontecem apenas em cidadezinhas do sertão. Só em 2010, o Conselho Regional de Enfermagem em São Paulo recebeu 250 denúncias de erros causados por profissionais da área. Vinte deles resultaram em morte ou lesão permanente para os pacientes.
Em dezembro de 2010, uma auxiliar de enfermagem injetou vaselina em vez de soro no corpo de Stephanie Teixeira, de 12 anos. A menina, que tinha apenas uma virose, em poucas horas morreu. Semanas depois, também em São Paulo, outra auxiliar de enfermagem decepou a ponta do dedo da pequena Tiffani Bahia, de 1 ano, ao tentar arrancar um curativo com uma tesoura.
Certos profissionais não estão cumprindo nem o básico da profissão. “Me parece que esse é um problema que tem diversos fatores. Um dos fatores mais importantes que eu coloco é a baixa qualidade do ensino”, opina Manoel Carlos Neri, presidente do Conselho Federal de Enfermagem.
Em um hospital particular de São Paulo, sobram vagas para profissionais de enfermagem.
“Hoje eu estou com mais ou menos 20 vagas, de auxiliar técnico a enfermeiro. Não consigo preencher”, diz a gerente de enfermagem Hamdi Hassan.
Com 30 anos de experiência, Floracy Gomes Ribeiro, diretora de enfermagem do Hospital das Clínicas de São Paulo, supervisiona mais de dois mil funcionários. “O que nós temos observado nos últimos concursos é que nós temos tido uma reprovação de 50%”, avisa a diretora de enfermagem.
“A impressão que a gente tem que é que não tem fiscalização dos órgãos de ensino, porque está muito deficiente. Eles estão chegando muito mal preparados”, critica Hamdi Hassan.
Nunca foi tão fácil estudar enfermagem no Brasil. O curso para técnico, que exige apenas o Ensino Médio, e dura cerca de dois anos, é, disparado, o mais procurado do país. São mais de 1,7 mil escolas cadastradas.
“Precisaria que os mantenedores desses cursos encarassem a coisa com maior seriedade e não apenas querendo se beneficiar de uma explosão no mercado e ganhar dinheiro, para falar o português claro”, diz João Cardoso Palma Filho, secretário adjunto da Educação de São Paulo.
A equipe do Fantástico mostrou imagens da Escola de Base Ferrazense, curso técnico da Grande São Paulo, para a enfermeira Maria Therezinha Nóbrega da Silva, professora de enfermagem da escola do estado do Rio de Janeiro. Ela já fez parte da Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn) e é uma especialista na análise de cursos da área.
No laboratório, há falta de carrinho de medicamentos, maca, boneco de bebê para simulações e até pia.
“Pelo menos uma pia para habituar as pessoas a lavarem as mãos antes de fazerem os procedimentos deveria existir”, opina Therezinha Nóbrega.
Em Missão Velha, onde dona Maria Laurentino recebeu glicerina no lugar de soro, um curso técnico particular funciona em uma escola pública só aos fins de semana. No local, não tem laboratório.
“Não se pode improvisar laboratório para ensinar enfermagem. Isso não existe”, critica Therezinha.
A matrícula do curso Vera Cristo é feita em uma farmácia. As aulas já começaram há três meses, mas a produtora do Fantástico é aceita sem o menor problema. “Vai estudando em casa. Ela te dá o capitulo que você vai estudar e vai te marcar uma avaliação”, diz a atendente da farmácia.
O Conselho Estadual de Educação do Ceará garante que o curso de Missão Velha não tem autorização para funcionar.
“Se está havendo essas aulas, elas estão irregulares. Ela só pode abrir aulas depois de aprovado pelo conselho”, explica Edgar Linhares Lima, presidente do Conselho Estadual de Educação do Ceará.
Procurada pelo Fantástico, a coordenadora não quis dar entrevista. A Escola de Base Ferrazense, de São Paulo, também não quis se manifestar. As secretarias estaduais de Educação reconhecem que a fiscalização é insuficiente.
Fantástico: Isso quer dizer que no estado de São Paulo pode haver cursos que estão precários ou até que não poderiam estar funcionando?
João Cardoso Palma Filho: Pode, pode haver.
Para melhorar a inspeção dos cursos técnicos, a secretaria paulista pediu ajuda para entidades especializadas. “Uma escola de enfermagem ruim é quase um ato criminoso. Porque isso vai resultar em consequências muito sérias na hora do exercício profissional”, aponta Therezinha.
Para a mãe de Ana Clara, cada refeição da filha é um suspense. Há dois anos a menina sofre com as sequelas de um erro cometido por uma funcionária do Hospital Santa Catarina, em São Paulo. No lugar de um sedativo, a auxiliar de enfermagem injetou na boca da menina um ácido usado para dissolver verrugas. O líquido queimou a boca, o estômago e ainda provocou o estreitamento do esôfago de Ana Clara.
“A comida era no liquidificador. Se tinha o arroz com feijão, tínhamos que bater no liquidificador”, conta Márcia Zuccari, mãe de Ana Clara.
Aos 4 anos, Ana Clara ainda não frequenta escola.
“A gente tem medo de ela engasgar na hora da alimentação”, diz Alexandre Zuccari, pai da menina.
Para evitar o fechamento total do esôfago, a cada seis meses Ana Clara tem que tomar anestesia geral e passar por um procedimento de dilatação.
Por nota, o Hospital Santa Catarina disse que ofereceu toda a assistência para a recuperação de Ana Clara, e que, depois do incidente, revisou processos internos e passou a reavaliar periodicamente o trabalho das equipes de enfermagem.
Os erros não existem só entre auxiliares e técnicos. Ocorrem entre os profissionais de nível superior. Os números mostram que as faculdades de enfermagem também estão em alta.
“A procura no passado era muito por dedicação, por gostar. Hoje a procura é muito mais por mercado de trabalho aberto”, comenta Pedro de Jesus Silva, presidente do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro.
Em dez anos, o número de cursos oferecidos no Brasil ficou quase cinco vezes maior.
“Já chegamos a ter conhecimento aqui de faculdades que o aluno, durante toda a sua formação, fez os estágios apenas dentro de laboratórios e nunca foi a uma unidade de saúde para lidar diretamente com o paciente”, revela Manoel Carlos Neri, presidente do Conselho Federal de Enfermagem.
A cada três anos, o Ministério da Educação realiza um exame para avaliar a qualidade do ensino nas faculdades de enfermagem. Entre 2004 e 2007, a porcentagem de cursos com avaliação abaixo da média subiu de 6% para 47%.
“O ministério vai tomar ações incisivas e no limite, fechar cursos, fechar vagas e até mesmo fechar instituições”, garante o secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior, Luís Fernando Massonetto.
No município de João Pinheiro, no noroeste do estado de Minas Gerais, fica uma faculdade particular que, segundo o Ministério da Educação, teve um dos cursos de enfermagem mais mal avaliados do país.
O último dado disponível é do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) de 2007: o máximo que os alunos do curso conseguiram foi a nota mínima: um – em uma escala que vai de um a cinco.
Logo no início da visita da reportagem, marcada com antecedência, a responsável pelo ensino de enfermagem se apressou em mostrar um laboratório todo arrumado e equipado, mas, sobre o curso em si, a coordenadora Eliane Batista pouco sabe.
Fantástico: Quantos professores de enfermagem vocês têm?
Eliane: Nós temos, aproximadamente, oito enfermeiros, mais professores de outras disciplinas que não são específicas.
Fantástico: Mas de enfermagem, você falou uns oito.
Eliane: Um professor, ele às vezes trabalha com duas ou três disciplinas. Tem aquelas disciplinas do curso que são específicas do enfermeiro.
Fantástico: Então, mas quantos professores tem o curso de enfermagem?
Eliane: Podemos dizer seis.
O Fantástico pergunta se virão novas turmas. “Vai ter vestibular no final deste ano para todos os cursos”, avisa Eliane.
A verdade é que, por ordem judicial, a faculdade está impedida de receber novos alunos. Uma série de irregularidades constatadas pelos fiscais levou o MEC a descredenciar todos os cursos da instituição.
“A partir do momento que saiu a decisão suspendendo o ingresso dos alunos, a gente não pode colocar aluno”, afirma o diretor jurídico da instituição, Cláudio Giansante.
Mas não são apenas cursos ruins que podem provocar erros. Tem também a sobrecarga de trabalho.
No abrigo Cristo Redentor, em São Gonçalo, as fiscais do Conselho Regional do Rio de Janeiro encontram um cenário assustador. Ao todo, são 182 idosos e apenas um enfermeiro no comando de seis auxiliares e técnicos. O recomendado nessa situação seria ter, no mínimo, nove enfermeiros e 18 auxiliares e técnicos.
“Ali você tem pacientes totalmente dependentes da enfermagem”, aponta Ana Teresa Ferreira de Souza, chefe da fiscalização do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro.
O resultado são prontuários dos paciente em branco; geladeira de medicamentos com alimentos vencidos; remédios de uso controlado misturados, sem identificação ou data de validade e em péssimas condições de higiene; e lixo infectante em lugar perigoso.
O mais preocupante: pacientes com graves lesões infeccionadas. A sobrecarga ocorre também por causa dos baixos salários.
Lizete Lopes é auxiliar de enfermagem há 17 anos. Trabalha três dias da semana em um hospital, três em outro e ainda faz curso de especialização. “É cansativo. Às vezes, chega até ser exaustivo, dependendo do plantão”, diz.
Para evitar erros, Lizete se apega aos chamados "cinco certos" da profissão. O paciente certo, o medicamento certo, a prescrição certa, a hora certa, pela via certa. Assim faz também uma legião de profissionais de enfermagem Brasil afora.
A enfermeira Lilian Behring é a primeira pessoa que muitos pacientes veem quando renascem de uma cirurgia no coração, no CTI.
“Imagina você com um tubo na boca, fica muito agitado”, diz Lilian.
Seu José Carlos Inácio acaba de ser transferido para a enfermaria e não esquece a atenção que recebeu.
“O medo que eu estava era muito grande. Com a força que ela me deu, me senti a pessoa mais importante do mundo para ela”, conta Seu José.
A chefe da enfermagem de UTI neonatal Inês da Silva fica emocionada ao olhar para os bebezinhos que ajudou a salvar em quase 20 anos de trabalho. “Essa criança nasceu no dia do meu aniversário, deve estar com uns 16 anos”, conta ela.
“Ontem ela pegou uma cadeira de balanço para mim, para eu ficar ninando meu filho. Foi a segunda vez que botei ele no colo depois de 17 dias”, diz Claudia Lins de Albuquerque, mãe de Antônio.
Os pais do pequeno Antônio querem ser os próximos a voltar com uma bela foto de agradecimento. “Você se sente acolhido. É uma sensação em que a gente fica muito frágil”, afirma Claudia.
Procuramos o Hospital Geral de Nova Iguaçu, onde a equipe do Fantástico mostrou, no começo desta reportagem, profissionais de enfermagem trabalhando sem luvas e pacientes recebendo medicamentos sem identificação.
“Eu acredito que, nesse momento, eles estavam atendendo com urgência os casos. Posteriormente vem o rótulo, porque o atendimento é de emergência”, argumenta Maria Aparecida de Lima, chefe da enfermagem do Hospital Geral de Nova Iguaçu.
Já Hélio Abicalil, diretor-presidente do Abrigo Cristo Redentor, disse que quer resolver em 30 dias os problemas apontados pela fiscalização. Ele reconheceu que a equipe de enfermagem é pequena, mas que tem limitações financeiras por se tratar de uma entidade filantrópica.
“Eu não posso, como administrador, aumentar uma folha de pagamento se não terei condição de cumprir”, diz Hélio.
Nos próximos dias, o Conselho Regional de Enfermagem do Rio vai enviar à Vigilância Sanitária, ao Ministério Público Estadual e às secretarias municipais de Saúde um relatório com as irregularidades encontradas nas duas instituições.
“Errar na enfermagem não pode. Você pode causar danos irreparáveis à sociedade e não dá para aceitar”, afirma Pedro de Jesus Silva, presidente do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro.
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Fonte: Fantástico
No Rio de Janeiro, fiscais do Conselho Regional de Enfermagem (Coren) entram no Hospital Geral de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. A superlotação é evidente. Regras básicas da enfermagem são quebradas a todo instante. Uma profissional faz um procedimento em uma paciente sem usar luvas. “Eu não lembrei, na verdade. Mas não é sempre”, defende-se ela. Perguntada sobre a existência de material suficiente para trabalhar, a funcionária garante que tem.
No pronto-socorro, a fiscal se espanta com as condições do braço de um paciente, onde um acesso para medicação foi implantado seis dias antes.
“Você via ali um tecido roxo, que é sinal de infecção. Aquele procedimento, ao menor sinal de vermelhidão local, tem que ser trocado”, explica Ana Teresa Ferreira de Souza, chefe da fiscalização do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro (Coren-RJ).
Momentos depois, a auxiliar continua sem luvas. Ela garante que é só para botar o soro. “Observamos que ela não fez a higienização das mãos e atendeu vários pacientes ao mesmo tempo. Ela pode estar transmitindo bactérias de um paciente para o outro”, alerta a fiscal do Coren-RJ Wendy Koehler. E o pior de tudo: “Nada tem rótulo, eu não sei o que está sendo infundido”, acrescenta ela.
“A grande maioria dos pacientes estava com soro sem rótulo, sem identificação de nome e medicação”, denuncia Ana Teresa. É uma prática extremamente arriscada. “Você não tem identificação do nome do paciente, do horário daquele medicamento nem do próprio medicamento e dosagem. Com isso, você pode ter a troca”, diz a chefe da fiscalização do Coren-RJ.
As fiscais cobram explicações da enfermeira responsável pelo pronto-socorro. “Você pode fazer uma identificação menor, mas essa identificação tem que ter”, afirma a chefe de enfermagem. “Tenho que ver com a equipe por que isso não está sendo feito”, acrescenta ela.
Ana Teresa Ferreira de Souza especula sobre o motivo de alguns profissionais de enfermagem não seguirem os procedimentos corretos: “O hábito de estar fazendo aquilo, achar que o erro nunca vai acontecer com ele, que a fatalidade nunca vai chegar àquele profissional”. Só no Estado do Rio, o número de denúncias contra profissionais de enfermagem praticamente dobrou de 2009 para 2010.
Se dependesse apenas dos números, o brasileiro tinha tudo para estar em ótimas mãos. Existem hoje no país 1,5 milhão de enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem. A cada ano, surgem pelo menos cem mil novos profissionais. Felizmente, a maioria cuida bem dos pacientes. Mas nunca houve tantos erros cometidos pela categoria.
“Nós temos observado, principalmente nos últimos cinco anos, um aumento muito grande das denúncias, um incremento da ordem de 20% a 25% ao ano. Erros simples que poderiam ser perfeitamente evitados se esse atendimento tivesse sido realizado com maior atenção”, aponta Manoel Carlos Neri, presidente do Conselho Federal de Enfermagem.
A equipe do Fantástico foi até o interior do Ceará, na zona rural do município de Missão Velha, que fica a 600 quilômetros de Fortaleza, para conversar com a família de dona Maria Laurentino. Ela tinha 78 anos e passou mal em julho de 2011. Estava com cansaço e dificuldade para respirar. Foi levada para o hospital da cidade e acabou sendo vítima de um erro de uma auxiliar de enfermagem.
“Entrei com ela no hospital, vi a enfermeira aplicando soro no braço dela”, conta José de Souza, filho de dona Maria.
“Começou a aparecer umas espumas na lateral da boca”, continua Rosa Laurentino, nora de dona Maria.
De madrugada, dona Maria foi transferida às pressas para outro hospital, no município vizinho de Barbalha. “O médico que atendeu ela foi quem falou que ela tinha vindo de lá com uma medicação imprópria”, acrescenta Silvana de Souza, neta de dona Maria.
Às 7h, dona Maria Laurentino morreu. “Ela cansava de ir na roça, colher feijão. Catava feijão. Minha mãe morreu”, lamenta, emocionado, o filho.
No laudo do IML, a causa da morte: embolia pulmonar por infusão de glicerina. No lugar do soro, a auxiliar de enfermagem do hospital de Missão Velha injetou em dona Maria uma substância oleosa usada para lavagem intestinal. No sangue, a glicerina causa um entupimento de vasos e artérias e rapidamente atinge o pulmão e o coração. O caso foi parar na polícia.
O frasco de soro é bem diferente do frasco de glicerina. Ela pegou o liquido e reparou que não havia o gancho para pendurar no suporte. Ela estranhou isso. Então pegou o frasco e fez um suporte com esparadrapo. “Em nenhum momento ela leu a etiqueta que estava posta no frasco. Tinha lá: glicerina a 12%”, diz o delegado Marcos Antônio dos Santos.
A auxiliar de enfermagem foi afastada do hospital e indiciada por homicídio culposo. Ela não quis conversar com a reportagem. Procuramos o médico que prescreveu o soro para dona Maria. Ele é o diretor clínico do hospital de Missão Velha, um lugar onde medicamentos controlados dividem espaço com grilos.
Fantástico: Por que deram a medicação errada para ela?
Luciano Santana, diretor clínico do hospital de Missão Velha: Essa pergunta eu não posso responder porque não fiz a medicação. Aliás, eu não administro medicação.
Fantástico: O senhor não viu o frasco que ela pegou?
Luciano Santana: Não vi. Ela foi pegar lá dentro. O médico prescreve e entrega para o auxiliar e o enfermeiro que esteja por lá para ver.
De acordo com a lei, auxiliares e técnicos só podem trabalhar com a supervisão de um enfermeiro. Mas não foi isso que aconteceu naquela madrugada.
Fantástico: Por que não tinha uma enfermeira?
Luciano Santana: Não sei te dizer.
Fantástico: O senhor é diretor clinico do hospital.
Luciano Santana: Bem, mas o que aconteceu foi o seguinte: até 22h, tinha um enfermeiro.
Fantástico: De 22h às 5h não tinha.
Luciano Santana: Aí eu não sei. Eu não sei lhe falar onde estava no momento.
Histórias como essa não acontecem apenas em cidadezinhas do sertão. Só em 2010, o Conselho Regional de Enfermagem em São Paulo recebeu 250 denúncias de erros causados por profissionais da área. Vinte deles resultaram em morte ou lesão permanente para os pacientes.
Em dezembro de 2010, uma auxiliar de enfermagem injetou vaselina em vez de soro no corpo de Stephanie Teixeira, de 12 anos. A menina, que tinha apenas uma virose, em poucas horas morreu. Semanas depois, também em São Paulo, outra auxiliar de enfermagem decepou a ponta do dedo da pequena Tiffani Bahia, de 1 ano, ao tentar arrancar um curativo com uma tesoura.
Certos profissionais não estão cumprindo nem o básico da profissão. “Me parece que esse é um problema que tem diversos fatores. Um dos fatores mais importantes que eu coloco é a baixa qualidade do ensino”, opina Manoel Carlos Neri, presidente do Conselho Federal de Enfermagem.
Em um hospital particular de São Paulo, sobram vagas para profissionais de enfermagem.
“Hoje eu estou com mais ou menos 20 vagas, de auxiliar técnico a enfermeiro. Não consigo preencher”, diz a gerente de enfermagem Hamdi Hassan.
Com 30 anos de experiência, Floracy Gomes Ribeiro, diretora de enfermagem do Hospital das Clínicas de São Paulo, supervisiona mais de dois mil funcionários. “O que nós temos observado nos últimos concursos é que nós temos tido uma reprovação de 50%”, avisa a diretora de enfermagem.
“A impressão que a gente tem que é que não tem fiscalização dos órgãos de ensino, porque está muito deficiente. Eles estão chegando muito mal preparados”, critica Hamdi Hassan.
Nunca foi tão fácil estudar enfermagem no Brasil. O curso para técnico, que exige apenas o Ensino Médio, e dura cerca de dois anos, é, disparado, o mais procurado do país. São mais de 1,7 mil escolas cadastradas.
“Precisaria que os mantenedores desses cursos encarassem a coisa com maior seriedade e não apenas querendo se beneficiar de uma explosão no mercado e ganhar dinheiro, para falar o português claro”, diz João Cardoso Palma Filho, secretário adjunto da Educação de São Paulo.
A equipe do Fantástico mostrou imagens da Escola de Base Ferrazense, curso técnico da Grande São Paulo, para a enfermeira Maria Therezinha Nóbrega da Silva, professora de enfermagem da escola do estado do Rio de Janeiro. Ela já fez parte da Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn) e é uma especialista na análise de cursos da área.
No laboratório, há falta de carrinho de medicamentos, maca, boneco de bebê para simulações e até pia.
“Pelo menos uma pia para habituar as pessoas a lavarem as mãos antes de fazerem os procedimentos deveria existir”, opina Therezinha Nóbrega.
Em Missão Velha, onde dona Maria Laurentino recebeu glicerina no lugar de soro, um curso técnico particular funciona em uma escola pública só aos fins de semana. No local, não tem laboratório.
“Não se pode improvisar laboratório para ensinar enfermagem. Isso não existe”, critica Therezinha.
A matrícula do curso Vera Cristo é feita em uma farmácia. As aulas já começaram há três meses, mas a produtora do Fantástico é aceita sem o menor problema. “Vai estudando em casa. Ela te dá o capitulo que você vai estudar e vai te marcar uma avaliação”, diz a atendente da farmácia.
O Conselho Estadual de Educação do Ceará garante que o curso de Missão Velha não tem autorização para funcionar.
“Se está havendo essas aulas, elas estão irregulares. Ela só pode abrir aulas depois de aprovado pelo conselho”, explica Edgar Linhares Lima, presidente do Conselho Estadual de Educação do Ceará.
Procurada pelo Fantástico, a coordenadora não quis dar entrevista. A Escola de Base Ferrazense, de São Paulo, também não quis se manifestar. As secretarias estaduais de Educação reconhecem que a fiscalização é insuficiente.
Fantástico: Isso quer dizer que no estado de São Paulo pode haver cursos que estão precários ou até que não poderiam estar funcionando?
João Cardoso Palma Filho: Pode, pode haver.
Para melhorar a inspeção dos cursos técnicos, a secretaria paulista pediu ajuda para entidades especializadas. “Uma escola de enfermagem ruim é quase um ato criminoso. Porque isso vai resultar em consequências muito sérias na hora do exercício profissional”, aponta Therezinha.
Para a mãe de Ana Clara, cada refeição da filha é um suspense. Há dois anos a menina sofre com as sequelas de um erro cometido por uma funcionária do Hospital Santa Catarina, em São Paulo. No lugar de um sedativo, a auxiliar de enfermagem injetou na boca da menina um ácido usado para dissolver verrugas. O líquido queimou a boca, o estômago e ainda provocou o estreitamento do esôfago de Ana Clara.
“A comida era no liquidificador. Se tinha o arroz com feijão, tínhamos que bater no liquidificador”, conta Márcia Zuccari, mãe de Ana Clara.
Aos 4 anos, Ana Clara ainda não frequenta escola.
“A gente tem medo de ela engasgar na hora da alimentação”, diz Alexandre Zuccari, pai da menina.
Para evitar o fechamento total do esôfago, a cada seis meses Ana Clara tem que tomar anestesia geral e passar por um procedimento de dilatação.
Por nota, o Hospital Santa Catarina disse que ofereceu toda a assistência para a recuperação de Ana Clara, e que, depois do incidente, revisou processos internos e passou a reavaliar periodicamente o trabalho das equipes de enfermagem.
Os erros não existem só entre auxiliares e técnicos. Ocorrem entre os profissionais de nível superior. Os números mostram que as faculdades de enfermagem também estão em alta.
“A procura no passado era muito por dedicação, por gostar. Hoje a procura é muito mais por mercado de trabalho aberto”, comenta Pedro de Jesus Silva, presidente do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro.
Em dez anos, o número de cursos oferecidos no Brasil ficou quase cinco vezes maior.
“Já chegamos a ter conhecimento aqui de faculdades que o aluno, durante toda a sua formação, fez os estágios apenas dentro de laboratórios e nunca foi a uma unidade de saúde para lidar diretamente com o paciente”, revela Manoel Carlos Neri, presidente do Conselho Federal de Enfermagem.
A cada três anos, o Ministério da Educação realiza um exame para avaliar a qualidade do ensino nas faculdades de enfermagem. Entre 2004 e 2007, a porcentagem de cursos com avaliação abaixo da média subiu de 6% para 47%.
“O ministério vai tomar ações incisivas e no limite, fechar cursos, fechar vagas e até mesmo fechar instituições”, garante o secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior, Luís Fernando Massonetto.
No município de João Pinheiro, no noroeste do estado de Minas Gerais, fica uma faculdade particular que, segundo o Ministério da Educação, teve um dos cursos de enfermagem mais mal avaliados do país.
O último dado disponível é do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) de 2007: o máximo que os alunos do curso conseguiram foi a nota mínima: um – em uma escala que vai de um a cinco.
Logo no início da visita da reportagem, marcada com antecedência, a responsável pelo ensino de enfermagem se apressou em mostrar um laboratório todo arrumado e equipado, mas, sobre o curso em si, a coordenadora Eliane Batista pouco sabe.
Fantástico: Quantos professores de enfermagem vocês têm?
Eliane: Nós temos, aproximadamente, oito enfermeiros, mais professores de outras disciplinas que não são específicas.
Fantástico: Mas de enfermagem, você falou uns oito.
Eliane: Um professor, ele às vezes trabalha com duas ou três disciplinas. Tem aquelas disciplinas do curso que são específicas do enfermeiro.
Fantástico: Então, mas quantos professores tem o curso de enfermagem?
Eliane: Podemos dizer seis.
O Fantástico pergunta se virão novas turmas. “Vai ter vestibular no final deste ano para todos os cursos”, avisa Eliane.
A verdade é que, por ordem judicial, a faculdade está impedida de receber novos alunos. Uma série de irregularidades constatadas pelos fiscais levou o MEC a descredenciar todos os cursos da instituição.
“A partir do momento que saiu a decisão suspendendo o ingresso dos alunos, a gente não pode colocar aluno”, afirma o diretor jurídico da instituição, Cláudio Giansante.
Mas não são apenas cursos ruins que podem provocar erros. Tem também a sobrecarga de trabalho.
No abrigo Cristo Redentor, em São Gonçalo, as fiscais do Conselho Regional do Rio de Janeiro encontram um cenário assustador. Ao todo, são 182 idosos e apenas um enfermeiro no comando de seis auxiliares e técnicos. O recomendado nessa situação seria ter, no mínimo, nove enfermeiros e 18 auxiliares e técnicos.
“Ali você tem pacientes totalmente dependentes da enfermagem”, aponta Ana Teresa Ferreira de Souza, chefe da fiscalização do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro.
O resultado são prontuários dos paciente em branco; geladeira de medicamentos com alimentos vencidos; remédios de uso controlado misturados, sem identificação ou data de validade e em péssimas condições de higiene; e lixo infectante em lugar perigoso.
O mais preocupante: pacientes com graves lesões infeccionadas. A sobrecarga ocorre também por causa dos baixos salários.
Lizete Lopes é auxiliar de enfermagem há 17 anos. Trabalha três dias da semana em um hospital, três em outro e ainda faz curso de especialização. “É cansativo. Às vezes, chega até ser exaustivo, dependendo do plantão”, diz.
Para evitar erros, Lizete se apega aos chamados "cinco certos" da profissão. O paciente certo, o medicamento certo, a prescrição certa, a hora certa, pela via certa. Assim faz também uma legião de profissionais de enfermagem Brasil afora.
A enfermeira Lilian Behring é a primeira pessoa que muitos pacientes veem quando renascem de uma cirurgia no coração, no CTI.
“Imagina você com um tubo na boca, fica muito agitado”, diz Lilian.
Seu José Carlos Inácio acaba de ser transferido para a enfermaria e não esquece a atenção que recebeu.
“O medo que eu estava era muito grande. Com a força que ela me deu, me senti a pessoa mais importante do mundo para ela”, conta Seu José.
A chefe da enfermagem de UTI neonatal Inês da Silva fica emocionada ao olhar para os bebezinhos que ajudou a salvar em quase 20 anos de trabalho. “Essa criança nasceu no dia do meu aniversário, deve estar com uns 16 anos”, conta ela.
“Ontem ela pegou uma cadeira de balanço para mim, para eu ficar ninando meu filho. Foi a segunda vez que botei ele no colo depois de 17 dias”, diz Claudia Lins de Albuquerque, mãe de Antônio.
Os pais do pequeno Antônio querem ser os próximos a voltar com uma bela foto de agradecimento. “Você se sente acolhido. É uma sensação em que a gente fica muito frágil”, afirma Claudia.
Procuramos o Hospital Geral de Nova Iguaçu, onde a equipe do Fantástico mostrou, no começo desta reportagem, profissionais de enfermagem trabalhando sem luvas e pacientes recebendo medicamentos sem identificação.
“Eu acredito que, nesse momento, eles estavam atendendo com urgência os casos. Posteriormente vem o rótulo, porque o atendimento é de emergência”, argumenta Maria Aparecida de Lima, chefe da enfermagem do Hospital Geral de Nova Iguaçu.
Já Hélio Abicalil, diretor-presidente do Abrigo Cristo Redentor, disse que quer resolver em 30 dias os problemas apontados pela fiscalização. Ele reconheceu que a equipe de enfermagem é pequena, mas que tem limitações financeiras por se tratar de uma entidade filantrópica.
“Eu não posso, como administrador, aumentar uma folha de pagamento se não terei condição de cumprir”, diz Hélio.
Nos próximos dias, o Conselho Regional de Enfermagem do Rio vai enviar à Vigilância Sanitária, ao Ministério Público Estadual e às secretarias municipais de Saúde um relatório com as irregularidades encontradas nas duas instituições.
“Errar na enfermagem não pode. Você pode causar danos irreparáveis à sociedade e não dá para aceitar”, afirma Pedro de Jesus Silva, presidente do Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro.
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Fonte: Fantástico
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