Enfermeira injeta silicone industrial em pacientes

UOL Notícias
A Justiça colocou em liberdade a enfermeira Fernanda Ouverney Valente, 25, menos de 12 horas após ela ser presa acusada de aplicar mistura contendo polimetilmetacrilato — cuja marca mais conhecida no mercado é Metacrill — em mulheres que queriam aumentar as nádegas e acabaram com graves lesões. Cirurgião plástico especialista no produto, José Ricardo Simões disse que, pelos ferimentos das vítimas, o mais provável é que tenha sido injetado silicone industrial, como o usado em carros e para lubrificar peças de avião.

À polícia, a enfermeira afirmou que usou Metacrill. Ela foi presa às 13h de sexta-feira e, antes da meia-noite, estava livre, pois a Justiça considerou que ela tem emprego fixo e não representa risco à ordem pública. As aplicações, que, segundo Fernanda, custam R$ 200, aconteciam na casa das clientes e numa clínica na Rua Catiri, em Bangu (RJ).

´Ela, como enfermeira, não poderia aplicar nada. E, pelo valor que cobrava, é bem possível que usasse silicone industrial. Um aplicação com profissional custa entre R$ 8 mil e R$ 10 mil´, explica Simões.

O silicone líquido também é usado em obras e para lubrificar máquinas. Uma terceira vítima foi localizada. Todas estão hospitalizadas há mais de 15 dias e sem previsão de alta — duas, em estado grave. O último caso registrado na 64ª DP ( Meriti) foi o de dona de casa que gastou R$ 2 mil em quatro sessões. No hospital para a retirada do material injetado, ela sofreu parada cardiorrespiratória.

´Ela ficou três dias no CTI e agora está com anemia profunda. A médica tirou 4,6 l de secreção, sangue e material não identificado na raspagem das duas feridas que se abriram nas nádegas. Durante a limpeza da necrose, foram encontrados pedaços pequenos de silicone´, contou o marido dela, um policial militar de 42 anos.

Amigas de São João de Meriti, uma comerciante de 42 anos e uma cantora de 26 estão no Hospital Albert Schweitzer, em Realengo. Elas fizeram a aplicação no mesmo dia. As feridas abertas pelo produto chegam a um palmo de comprimento e até 6 cm de profundidade.

´Minha mulher gemia de dor. Ela já voltou da clínica de Bangu de bruços, no carro, porque não conseguia sentar. A Fernanda prometeu a ela efeito igual ao da prótese de silicone´, relatou o marido da cantora.

Documentos apreendidos na casa de Fernanda Ouverney Valente, em São João de Meriti, e receituários usados por ela durante visitas às clientes podem revelar a participação de médicos no esquema de compra de medicamentos para uso irregular. Amanhã, está previsto o depoimento de um pediatra que tem o nome impresso em embalagens de laboratório achadas na residência.

Uma das receitas passada pela enfermeira para amenizar as crises de dor da comerciante internada está em papel timbrado da Prefeitura de São João de Meriti e tem carimbo, CRM e a assinatura de um médico militar, que é funcionário da Secretaria de Saúde de lá. A Prefeitura de Meriti já informou que abriu procedimento interno para investigar o assunto.

´Quero saber se esses receituários foram roubados ou se tem conivência de médicos´, disse o delegado da 64ª DP (São João de Meriti), Alexandre Ziehe. O advogado de Fernanda, Anderson Fernandes, disse que sua cliente fez a compra do produto aplicado na Internet.

O Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro (Coren-RJ) informou, ontem, que Fernanda Ouverney Valente será ouvida pela Comissão de Ética, para apurar as denúncias contra ela. O presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, José Orácio Aboudib, alertou sobre o fato de que qualquer procedimento invasivo deve ser feito por um médico.

Ele disse ainda que é contrário ao uso de polimetilmetacrilato para uso estético devido à quantidade de problemas relatados por pacientes e colegas de profissão. As instruções de uso do implante injetável polimetilmetacrilato divulgadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) mostram que o produto deve ser usado em pequenos procedimentos e também atestam que a aplicação deve ser realizada por médicos.

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