Alguns dos conflitos por terra estão sendo resolvidos na base do acordo, outros são levados para a Justiça
Brejo Santo A maioria dos pequenos municípios do Cariri está "brigando" na justiça por sua autonomia política, administrativa e territorial. A Prefeitura de Abaiara reivindica a Vila de Conceição que foi dominada por Brejo Santo. O mesmo problema ocorre com o povoado de Pontal da Serra, no limite entre Brejo Santo, Missão Velha e Abaiara. Em Jardim, além do conflito quanto aos limites entre Barbalha e Jati, os moradores da Serra do Taquari não sabem se são cearenses ou pernambucanos. O prefeito de Jati, Luiz Celestino, entrou com uma ação na Justiça Federal reivindicado a posse de cinco sítios e fazendas que foram "engolidos" por Jati. O Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece) confirma que outros municípios estão em litígio, como Caririaçu, Granjeiro, Milagres, Barbalha e Mauriti.
Alguns desses conflitos estão sendo resolvidos como acordos entre os prefeitos como foi o caso do limite de Barbalha com Jardim, no Sítio Cacimbas. "Outros estão na dependência de entendimentos entre os chefes dos executivos municipais", diz o procurador dos municípios de Jardim e Brejo Santo, Marcos Antônio Sampaio de Souza, esclarecendo que este problema foi gerado pelo Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que alterou a demarcação inicial dos municípios. "No caso do limite com Pernambuco, o problema é mais complicado. Deve ser resolvido entre os governos dos dois Estados".
A maioria dos habitantes da Vila de Conceição não quer nem ouvir falar em pertencer à Abaiara. "Aqui todo mundo é de Brejo Santo", diz o comerciante Marcos Lucena. Comenta que tudo que tem ali foi feito pelos prefeitos de Brejo Santo: posto de saúde, escola, praça e estrada.
A mesma manifestação de repúdio é demonstrada pelos moradores do Pontal da Serra, um pequeno povoado no sopé da Serra do Araripe. O prefeito de Abaiara, Francisco Sampaio, mandou calçar uma das ruas do povoado, ao lado da capela de Santo Antônio, com o objetivo, segundo os moradores, de sensibilizar a comunidade. "Nós somos de Brejo Santo, com muito orgulho, tudo que tem aqui é de Brejo Santo, não tem nada de Abaiara, a não ser este calçamento que o prefeito mandou fazer sem a gente pedir", afirma o diretor da Associação dos Pequenos Produtores do Pontal da Serra, José Nilton. É verdade. A comunidade do Pontal da Serra não tem nenhuma ligação com Abaiara. Não existe, sequer, uma estrada para a cidade que defende o direito de posse do povoado. O motorista tem que subir a Serra do Araripe pela estrada de Brejo Santo para o São Filipe e, depois, descer pela ladeira do Aleixo. Depois de 4km de estrada péssima, chega-se ao local.
No decorrer da semana, o prefeito de Abaiara, Chico Sampaio, não foi localizado pela reportagem. A informação era de que ele estava viajando. Os dois celulares utilizados pelo prefeito não atenderam as ligações.
O chefe da unidade estadual do IBGE, Francisco Lopes, esclarece que o órgão obedeceu a Lei Estadual que criou o município. "Não temos competência para alterar a legislação", afirma, acrescentando que os municípios prejudicados devem acionar os deputados estaduais para, se for o caso, modificar a Lei, ou fazer cumprir a legislação.
A direção do Ipece esclarece que não recebeu oficialmente a citação da Justiça Federal. Admite, porém, que o uso de legislação esparsa, de épocas diferentes, sem consolidações periódicas, gera grande dificuldade de entendimento, tornando o processo de definição das divisas legais e sua representação cartográfica um verdadeiro "quebra- cabeças". Para delimitar um município, segundo o Ipece, se faz necessária, algumas vezes, a utilização de tantas leis quantos forem os municípios limítrofes e em algumas situações pode ser preciso, ainda, leis de municípios que não fazem mais limite com o que se está sendo traçado. Outro agravante, para o Ipece, é a existência de leis em que trechos da divisa e elementos cartográficos são referidos de forma incompleta, equivocada ou fora do sentido, ocasionando pendências técnicas e/ou descontinuidade no traçado dos limites. Por isto, se justifica a criação de uma nova lei pela Assembleia Legislativa. Segundo a legislação, o município que quiser incorporar área deve entrar com solicitação, mediante aprovação popular.
Conflito
"Os moradores das áreas em conflito preferem ficar com Brejo Santo"
Kallil Cavalcante, Assessor jurídico de Brejo Santo
"O município de Jati já engoliu 30% da área da cidade de Penaforte"
Raimundo Soares Filho, Assessor jurídico de Penaforte
"Queremos ficar com Brejo Santo. Não temos nenhuma ligação com Abaiara"
José Nilton Silva, Pres. da Assoc. dos Peq. Produtores do Sítio Pontal
MAIS INFORMAÇÕES
Prefeitura de Brejo Santo: (88) 3531.1042
Prefeitura de Abaiara: (88) 3558.1254
Ipece: (85) 3101.3496
JUSTIÇA FEDERAL
Jati já pediu antecipação de tutela
Penaforte O caso mais emblemático dessa disputa territorial o ocorre em Jati e Penaforte, ambos localizados no extremo Sul do Ceará. O prefeito de Jati, Luiz Celestino, entrou com um pedido de antecipação de tutela na Justiça Federal, contra o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), solicitando o restabelecimento dos seus limites. De acordo com a ação, assinada pela procuradora do município, Tallita Luzia Bezerra de Araújo, o município perdeu 30% do seu território para Jati. As localidades de Bom Haver, Caboclo, Queimada Grande, Jurema, Retiro e Poço Grande, que antes pertenciam legalmente à Penaforte, foram incorporadas à Jati.
A procuradora justifica que com a nova delimitação feita pelo IBGE e IPECE, o município ficará prejudicado, pois perderá base territorial para a comuna de Jati, diminuído a densidade demográfica, levando os prejuízos financeiros e administrativos, pois haverá diminuição dos repasses constitucionalmente previstos, desordenando, desse modo, todo um planejamento anteriormente efetivado.
Também não haverá, de acordo com a ação, como contabilizar todos os investimentos efetivados nas áreas de saúde, educação e infraestrutura, podendo a administração sofrer problemas de ordem contábil, juntos aos órgãos de controle, especialmente, o Tribunal de Contas da União e dos Municípios. Ela adverte que os habitantes dos distritos, que poderão ser integralizados na nova configuração cartográfica de Jati, perderão a identidade sócio-afetiva com o local onde nasceram, por ato não albergado pelas legislações que regulamentam a criação, incorporação, desmembramento, fusão de municípios.
Outro problema levantado pela procuradora é quanto à realização do próximo censo demográfico previsto para este mês. Permanecendo a situação atual, Penaforte terá uma redução significativa da sua população, o que implicaria em diminuição dos repasses já que os recursos da educação, saúde e assistência social são repassados de acordo com o número de habitantes.
Deitado numa rede na varanda de sua casa, no Sítio Retiro onde mora há 82 anos, o ex-vereador e ex-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Penaforte, Francisco Barros Freire, lembra que a rivalidade entre os dois municípios vem de longe, desde o tempo em que Jati era Macapá e Penaforte era "Baixio dos Doidos". "O acirramento aumentou em 1958, quando foi criado Jati".
A lei da Assembleia Legislativa, assinada pelo então presidente Flávio Marcilio, determina uma linha reta, do nascente ao poente, partindo do Riacho Fundo para o Riacho da Jurema. Ao lembrar o que diz a Lei, o velho sindicalista lamenta que não haja nenhum marco, indicando caminho da reta. "Esse tal de Ipece devia ter consultado os mais velhos para saber a realidade", complementa.
O ex-vereador sugere que seja feito um plebiscito para conhecer a vontade do povo. "Aqui, a maioria não quer depender de Jati. Nunca chegou ninguém de Jati para nos ajudar, reclama ele.
O secretário de Governo de Jati, Kael Rocha, que é filho do prefeito Arlindo Rocha, procura minimizar a polêmica, dizendo que "o mais importante é que cada um dos prefeitos cumpra a sua obrigação, trabalhando pelas comunidades que precisam de assistência".
MAIS INFORMAÇÕES
Prefeitura de Jati (88) 3575.1188/ 3575.1288
Prefeitura de Penaforte (88) 3559.1231
Antônio Vicelmo
Repórter
Fonte: DN
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